Empresas jornalísticas estão sendo “obrigadas” a investir em novos modelos de monetização. Chatbots, produtos digitais e modelos de assinatura são alternativas para tentar manter as portas abertas diante das quedas de tráfego orgânico causadas pela IA generativa.
As estratégias (e os resultados) variam bastante, mas envolvem basicamente:
Fortalecer as marcas das empresas e dos próprios jornalistas;
Criar canais autorais, que não sofrem a interferência de algoritmos;
Adaptar as linhas editoriais;
Implementar IA dentro das redações;
Criar novos incentivos para assinaturas.
Muitas ações não são necessariamente novas, mas estão ganhando mais espaço dentro dos jornais.
Veja abaixo as principais estratégias que estão sendo adotadas no Brasil e no exterior.
Este artigo foi inspirado neste post da Axios, que detalha a postura de empresas dos EUA contra um cenário de redução de tráfego enviado pelo Google. A equipe da SHH complementou as informações com novos exemplos e estratégias sendo adotadas em outros países.
A redução de cliques causada pela IA
O cenário pelo qual passa o jornalismo é bem complexo, mas pode ser resumido em: sites estão recebendo cada vez menos tráfego, pois os chatbots de IA resumem as informações.
É sempre importante lembrar que IA é só uma parte da equação. Desde quando eu estava na faculdade de jornalismo, entre 2014 e 2017, já se discutia a fragilidade de certos modelos de negócios que dependiam do clique para gerar receita.
Mas é fato que a escala do problema é sem precedentes, com ampla redução de cliques. O gráfico abaixo, publicado em uma pesquisa da Similarweb, ilustra bem que o tráfego em sites de notícia vive em queda acentuada desde o lançamento das AI Overviews do Google:
Temos uma cobertura completa aqui no site da SEO Happy Hour, explicando as causas, evolução do problema, impactos e estratégias para conter os danos.
Recomendo estas leituras:
A nova pesquisa do Google: o histórico das transformações no buscador, que passa a ter foco cada vez maior em IA generativa;
As mudanças na monetização: entenda como esse cenário dificulta a geração de receita por parte das empresas.
Dito isso, veja 12 estratégias sendo adotadas por grandes grupos de mídia.
1. Expansão de programas de assinaturas
Sites estão oferecendo novas modalidades de conteúdo para quem assina. Além dos clássicos “ver sem paywall” e “ler o site sem anúncios”, empresas também estão investindo em novos formatos de conteúdo, como reportagens em áudio, lives com jornalistas ou newsletters especiais.
Quem está fazendo: praticamente todos os portais investem no modelo. A revista Wired é um bom caso para estudar e acabou de lançar diversos conteúdos diferentes. Leia o manifesto aqui.
2. Canais proprietários
É um termo meio esquisito, mas significa produzir conteúdo em canais onde você se comunica diretamente com a audiência. Ou seja, não depende da “intermediação” de uma plataforma gerenciada por uma big tech, como um buscador.
Quem está fazendo: praticamente todos os grandes jornais. O The Verge é um bom exemplo a seguir. Na semana passada eles anunciaram diversas newsletters como forma de combater o cenário do “Google zero”, incluindo a possibilidade de seguir tópicos ou autores específicos. Leia o manifesto aqui.
3. Lançamento de novos produtos
Pode parecer estranho falar de “produtos” e “jornalismo” no mesmo contexto, mas empresas de mídia estão lançando novas alternativas de negócios em seus sites. Os produtos variam bastante, mas o que mais tem aparecido são plataformas próprias, eventos e experiências com IA.
A finalidade dos lançamentos é sempre a mesma: depender o mínimo de uma única (ou de poucas) plataformas para gerar receita.
Quem está fazendo: muitas empresas estão explorando a possibilidade. Entre elas, O Globo, que está mirando em personalização via IA. Nos EUA, o Business Insider está seguindo a mesma direção.
4. Programa de membros
É a criação de comunidades fechadas ou grupos exclusivos para compartilhamento de conteúdo ou experiências únicas. A estratégia se baseia no desejo de participar de algo que não pode ser mediado pela IA.
Quem está fazendo: a Nylon, revista de moda e cultura jovem dos EUA, tornou-se conhecida por seus eventos exclusivos. Eles estão lançando um grupo fechado de influenciadores, para depois “vender o acesso” a marcas que desejam anunciar para aquele perfil de público.
5. Aplicativos próprios
São aplicativos para acompanhar os conteúdos do jornal ou para entregar uma “experiência complementar”. É uma prática antiga, que tem um benefício extra na era da IA: conexão com uma audiência engajada sem o intermédio dos algoritmos.
Quem está fazendo: diversos jornais têm aplicativos próprios, onde assinantes podem ler as notícias. O The People lançou uma versão diferente, que imita o estilo do TikTok, com conteúdos curtos em formato vertical.
6. Plataformas próprias
Há marcas investindo em ecossistemas completos de mídia, com plataformas próprias. De certa forma, é parecido com ter um app, mas com uma abordagem mais complexa (e que exige um esforço muito maior de branding e de marketing).
Quem está fazendo: o Buzzfeed recentemente anunciou uma plataforma nova de mídia, chamada “BF Island”. Todas as marcas do grupo estarão envolvidas, em uma proposta de “consertar uma internet que está quebrada”. Parte do projeto envolve criar uma rede social para compartilhamento de conteúdo. Leia o manifesto aqui.
7. Uso de IA na rotina
A IA está sendo usada para aumentar a produtividade nas redações. A lógica é evitar o gasto de tempo com tarefas manuais, o que abre espaço para coberturas mais aprofundadas.
Quem está fazendo: praticamente todos os jornais têm políticas para uso de IA. Entre eles:
A Folha de S. Paulo “estimula os profissionais da Folha a utilizarem a IA para automatizar tarefas repetitivas”;
O Grupo Globo indica que os jornalistas “sempre adotarão ferramentas de inteligência artificial como um meio para produzir informação de qualidade: isenta, correta e prestada com rapidez”;
O Business Insider quer que 100% dos seus funcionários use o ChatGPT regularmente.
8. Adaptações editoriais
Esta tem sido a estratégia mais recorrente dos jornais. Significa, basicamente, mudar o jeito de produzir conteúdo e escrever notícias ou reportagens.
As adaptações podem envolver:
Mudanças no estilo de escrita;
Inclusão de resumos no topo das matérias, sejam eles escritos por humanos ou não;
Criação, encerramento ou fusões entre editorias;
Criação de conteúdo em formatos para redes sociais;
Mudanças na rotina dos profissionais.
Em alguns casos, infelizmente essas mudanças resultam em alterações no quadro de profissionais – o popular layoff (demissão em massa), ou passaralho, para ficar no jargão da área.
Quem está fazendo: muitas empresas estão se adaptando para “perseguir os cliques”. Alguns exemplos:
O Washington Post criou um TikTok bem no estilo da “geração Z”;
O Business Insider eliminou algumas editorias passará a investir em uma cobertura mais especializada;
O Globo desenvolveu uma IA própria para resumir reportagens, o Irineu;
O Daily Mail está investindo em conteúdo opinativo, que não pode ser facilmente resumido.
9. Chatbots próprios
Alguns portais estão desenvolvendo os seus próprios “bots”, para entregar à audiência a experiência de usar uma LLM, sem abrir mão do seu branding ou de um acesso ao portal.
Em alguns casos, é apenas uma interface do ChatGPT “repaginada” para entregar alguma experiência de marca.
Certos grupos de mídia estão fechando parcerias com desenvolvedoras de LLMs. É como se fosse um licenciamento de conteúdo, para que ele seja usado para treinar novos modelos, ou para alimentar certas experiências de IA.
Quem está fazendo: muitas empresas, como The Atlantic, Politico, Vox, Condé Nast (Vogue, The New Yorker, GQ, Vanity Fair, entre outras), The Guardian, The Washington Post e AP. Geralmente, a opção está limitada apenas aos grandes grupos, com milhões de visitas e múltiplas publicações sob o seu guarda-chuva.
11. Processos
É o caminho contrário das parcerias: processar as IAs contra uso indevido de conteúdo. As principais alegações são sobre violações de direitos autorais e de que precisa haver uma regulação sobre como e quando as LLMs podem acessar o conteúdo produzido por portais de notícia.
É uma “versão alternativa” do paywall onde os visitantes pagam para acessar cada página, em vez de ter uma assinatura mensal. É um modelo chamado offerwall, que recentemente passou a receber suporte do Google.
Quem está fazendo: atualmente, nenhum grande portal aderiu ao modelo. Mas, segundo o Google, 1000 portais fizeram parte do período de testes.
Aqui na SEO Happy Hour, não gostamos da iniciativa. Ainda assim, vale mencionar, pois é uma alternativa disponível aos donos de sites.
As habilidades e competências por trás das estratégias
Muitas ações são extremamente complexas, como lançar um aplicativo ou criar uma comunidade fechada. Inclusive, muitas das opções parecem completamente inviáveis para portais menores, ou que ainda não são estabelecidos no mercado.
Se este é o seu caso, compensa mais pensar nas habilidades e competências necessárias para lidar com as quedas de tráfego causadas pela IA.
Para aplicar as estratégias das grandes marcas, é necessário alinhar equipes em torno de áreas como:
Brandingpara construir uma marca que as pessoas de fato queiram consumir;
SEOpara melhorar a visibilidade do site, mesmo em um cenário de menos cliques;
Conteúdo multimídia para produzir em formatos mais interativos;
Desenvolvimento para programar novos produtos e experiências, como ferramentas ou aplicações;
Social media e CRM para engajar a audiência mesmo quando ela não clica no site;
Estratégia e planejamento para identificar oportunidades no mercado.
Qual é o melhor caminho para lidar com a queda de cliques?
A verdade incômoda é que ninguém sabe exatamente para onde o mercado está indo.
O que sabemos é que os portais que têm marcas fortes estão se saindo melhor. Quando um portal é reconhecido por uma cobertura de alto valor, que se comunica bem com a audiência, as pessoas acessam de forma direta, sem depender dos buscadores.
São sites que têm uma identidade editorial bem definida e publicam conteúdos de alto valor, que não podem ser facilmente replicados pela IA generativa.
Siga sempre esta lógica: o conteúdo do seu site pode ser facilmente encontrado em uma LLM? Se você não entrega nada de diferente, então realmente há pouca razão para clicar no seu site.
É triste e chega a ser até injusto para os portais ter o conteúdo “roubado” pelas IAs, mas infelizmente o mercado está caminhando nesta direção, ao menos por enquanto. Até existem alternativas em discussão, como o pay per crawl da Cloudflare, mas elas ainda não são realidade.
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Elyson Gums é redator na SEO Happy Hour. Trabalha com redação e produção de conteúdo para projetos de SEO e inbound marketing desde 2014, em segmentos B2C e B2B. É bacharel em Jornalismo (Univali/SC) e mestre em Comunicação Social (UFPR).
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